31 julho, 2012

A minha vergonha

Foto: We Heart It


Na semana passada fui ao banco, o que por acaso detesto fazer, já que na maioria das vezes o atendimento demora tanto que desisto e vou embora com o meu problema embaixo do braço, mas dessa vez tive de ficar ou teria que enfrentar outra fila daquelas para tentar novamente receber meu cartão.
No primeiro momento já fechei a cara, a fila para entrar no banco tinha mais voltas que a concha de caracol velho. Quase uma hora depois quando eu estava quase conseguindo entrar no banco aquela porta giratória-traiçoeira apitou e bufei de ódio. Revistaram minha bolsa e nada, eu já ficando impaciente quase batendo no guarda e então finalmente saí daquela fila para entrar em outra.
Meia-hora depois consegui ser atendida pela única atendente disponível, disse a ela o meu problema, ela muito mal-humorada por sinal, pediu meu RG e CPF e disse que ia olhar no sistema se meu cartão havia chegado, ou seja, eu esperaria mais meia-hora.
Fiquei impaciente no balcão, tremendo a perna por causa da ansiedade e em um movimento super natural passei a mão sobre o bolso da minha calça jeans e quase tive um ataque ali mesmo ao perceber que meu celular não estava lá. Procurei na bolsa, nos bolsos da bolsa e nada. Comecei então a olhar ao meu redor e eis que o vi, ele tinha ficado atrás de mim o tempo todo, tinha até puxado conversa como quem não queria nada. Só podia ser ele, deduzi.
O homem atrás de mim, era um jovem negro usando uma camisa velha e uma bermuda de surfista, com um capacete vermelho pendurado no braço e o boné virado para trás como se fosse um rapper, ele sorria para mim eu com certeza estava com uma baita cara de desesperada. Não agüentei, gritei “meu celular sumiu”. Comecei a olhar todo mundo torto. O homem atrás de mim perguntou “perdeu o celular?” e eu quase respondi: “Não você roubou!”, mas fiquei calada e me mandaram falar com um dos guardas.
“Seu guarda”, eu disse já chorando. “Meu celular sumiu.”
“Você não esqueceu de pegar ele quando passou na porta e deixou no porta-objetos?”
“NÃO!” Teimei. “Entrei com meu celular aqui!”
“Ah, moça, assim fica difícil!”
“Como assim?” Questionei ele na cara dura com todo mundo me olhando com os olhos arregalados. “Então o senhor está aqui porque mesmo?”
“Olha moça...” ele disse tentando ser o mais paciente e educado possível com aquela garota histérica dentro do banco. “Se a senhora esqueceu o outro guarda que fica lá na porta guardou, senão, eu não posso ajudar.”
Fui na gerência, o gerente me entregou o telefone e comecei a minha saga desesperada, ligando para o meu telefone e na esperança de ele tocar alto o bastante para eu apontar a cara do criminoso que tinha me deixado desesperada. O telefone chamou... chamou... chamou... e nada. Então o rapaz que estava atrás de mim na fila veio falar comigo outra vez, “E aí? Achou?” ele perguntou com um sorrisinho que já estava me dando raiva.
Pensei então comigo mesma, “esse cara me roubou e ainda tá curtindo com a minha cara!” Desisti do telefone e o entreguei para o gerente e pela expressão dele eu soube que estava com uma cara extremamente desesperada.
 “A senhora já foi falar com o guarda da porta?” O gerente perguntou com uma voz cálida e eu bufei. “Não seu gerente, porque entrei com meu celular aqui!”
“Mas vá até lá assim mesmo, vai que a senhora esqueceu né?” bufei outra vez, levantei, chorei, fiquei pensando que meu celular foi um presente do meu namorado, que era um celular caro demais para eu comprar outro, que tinha fotos e documentos e minha vida quase inteira dentro daquele cartão de memória e que o fulaninho que tirou ele de mim estava bem ali e eu não podia fazer absolutamente nada.
Finalmente fui até o guarda da porta e só de me olhar ele já soube do que se tratava. “Foi a senhora quem esqueceu o celular?” Fiquei com a cara no chão. Porém o pior para mim foi a vergonha. Logo eu que digo ser a favor da liberdade de expressão que não me prendo a “pré” “conceitos”, que sou a favor da diversidade, logo eu... e na primeira situação desconfio logo do “neguinho” atrás de mim, só por que ele puxou assunto, só por que ele se preocupou e tentou ser gentil, só por que ele estava mal vestido e falava gírias, só por isso achei logo que ele tinha me roubado.
É nessa hora que procurei um buraco para enfiar a minha cara de tacho, mas tudo que é ruim sempre fica pior, e o rapaz ainda veio falar comigo, “Você achou? Que bom! Sorte sua que ninguém pegou né?” e então a minha cara rolou ladeira abaixo, eu pus as mãos no rosto e tive vergonha de mim, por achar que eu estava livre logo desse preconceito, o preconceito de raça-cor, por que eu já sofri preconceito por ser negra e sei exatamente como dói, ser julgado pela cor, quando embaixo da pele tem sangue e o sangue de todo mundo é vermelho, não tem outra cor para isso, todo mundo é igual.
Havia mais de cem pessoas dentro daquele banco, havia mais de quarenta na mesma fila que eu, mas eu não percebi isso, só vi o “neguinho” atrás de mim puxando conversa, não desconfiei de ninguém mais por que todas as outras pessoas estava bem vestidas o bastante ou por que não era negras. A esse rapaz as minhas sinceras desculpas, a minha cara no chão e a minha vergonha.





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